Por: Fernando
Franco de Camargo.
Acordo bem cedo, antes
da minha mãe que costuma ser a primeira pessoa a despertar em nossa casa.
Espreguiço-me, estico os braços e logo em seguida coço os olhos. Sento-me na
beirada da cama toda desarrumada. Calço meus chinelos e ainda com sono me
levanto. Da minha cama até o banheiro são poucos metros, entro e olho minha
imagem refletindo no velho espelho quebrado, minha família é tão pobre que nem
um espelho novo pode comprar.
Escovo os dentes e lavo
a cara, e vou para o banho, regulo a temperatura da
água com o cabo da vassoura encostada no canto da parede. Posiciono-me embaixo
e sinto aquela água morna cair no meu corpo, nas minhas costas, na minha nuca.
Pronto!!! Banho tomado!!! Já vestido, vou até a cozinha, abro o armário e ali
dentro só encontro um único pedaço de pão, com minhas pequenas mãos eu divido
em dois, um pouco para mim e um pouco para ela, eu sei que é pouco, mas é tudo
o que nós temos para comer.
São tempos difíceis.
Desde que meu pai foi embora às coisas não andam nada fáceis. Minha mãe,
coitada, sai cedinho de casa todo santo dia. Na rua ela recolhe latinha, pede
dinheiro, faz de tudo para me sustentar. Na maioria das vezes ela volta sem
nada. Sem dinheiro, sem latinha, mas sempre com um sorriso estampado no rosto.
Minha mãe, apesar de todos os problemas nunca deixou de sorrir.
Visto a minha melhor
roupa e fico sentado na minha cadeira favorita, justamente aquela em que meu
pai ficava sentado. Vejo minha mãe saindo do quarto, o rosto cansado, não pela
falta de sono, mas pelo excesso de trabalho nos últimos tempos.
Espero pouco tempo e
avisto minha mãe já pronta. Corro até o armário para pegar a outra metade do
pão que eu mesmo dividi. Ofereço a ela, e ela recusa.
- Pode comer meu filho.
– Diz ela. Meio sem jeito pego o pedaço de pão e dou uma mordida e insisto.
- A senhora não quer
mesmo, mãe?
Ela me responde fazendo
um sinal com a cabeça. De mãos dadas saímos pela rua. Ao nosso redor árvores,
casas, pessoas dos dois lados da rua, gente conhecida e muitos desconhecidos.
Descemos a rua em direção ao ponto de ônibus e ficamos ali, parados, aguardando
o nosso transporte.
De cor azul com faixas
brancas nas laterais eu vejo o ônibus se aproximar. Entramos na parte de trás,
não temos dinheiro para pagar a passagem. No caminho, mais árvores e casas,
observo alguns comércios e mais gente, ao longe olho o homem do carrinho de
pipocas e a tia do cachorro-quente.
Chegamos!!! Fico na
frente da casa do meu pai, um lugar silencioso, triste e sem graça. Com o
portão aberto é fácil de entrar, outras pessoas também estão lá. Corro e pego
uma flor. Dou um sorriso para minha mãe e ela de retribui com outro. De flor em
mãos e com muito orgulho no peito fico na frente do meu pai. Aquele rosto lindo
sorrindo para mim, a barba bem feita e os cabelos curtos de cor negra.
Ajoelhei-me na frente
dele, com os olhos marejados eu pedi:
- Volta pra casa pai, à
gente precisa tanto do senhor!!!
Senti a mão da minha
mãe do meu ombro, e no alto dos meus dez anos de idade me virei e olhei bem no
fundo dos olhos dela. Agora eu entendia muito bem, ele não voltaria nunca mais,
porém eu prometo vir visita-lo toda vez que a saudade tomar conta do meu peito.
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