Senti o cheiro de longe
e isso me fez correr até ele. Era uma mistura de doce com salgado. O fogão
estava forrado com panelas, todas cheias. Em uma tinha arroz com carne, na
outra, feijão com bastante bacon e linguiça; tinha macarrão com molho e carne
de panela. No forno um bolo assando e na geladeira um mousse de manga pronto
para ser devorado.
Do lado de fora vovô
fabricava vassouras sentado na beirada da escada. Minha mãe e minha avó
cuidavam do almoço, enquanto meu pai e meus irmãos cavavam um buraco na terra a
procura de minhocas, eles iriam pescar mais tarde. Era divertido ver o
beija-flor chegar e se aproximar de um bebedouro com uma flor grudada nele e
ficar ali parado no ar com suas asas batendo numa velocidade descomunal.
Comida quase pronta.
Após desocupar uma das bocas do velho fogão azul, mamãe botou outra panela.
Vovô não almoçava sem antes saborear um prato de sopa. Um a um os ingredientes
foram sendo colocados: batata cortada em pequenos pedaços, cenoura em rodelas e
frango em cubinhos; a sopa seria feita com arroz.
Depois de tudo realmente
pronto todos se sentavam a mesa. Pratos brancos com detalhes desenhados nas
bordas, copos e talheres. Travessas com arroz, feijão, macarrão e a panela de
sopa do vô. E ali se fazia o silêncio, ninguém falava, resmungava ou reclamava,
era uma quietude só. Terminada as refeições os pratos eram recolhidos e a louça
era lavada, tudo era guardado nos armários e nas gavetas. Tudo seria repetido
no dia seguinte.
Varas separadas, anzóis
também e as iscas colocadas dentro de uma lata velha de achocolatado. Chapéu de
palha enfiado na cabeça para proteger do sol quente e um recipiente telado para
botar os peixes pescados. O caminho até o lago era feito a pé, de chinelo de
dedo para proteger das pedras e do cascalho que machucava. No local tudo era
arrumado; as varas eram posicionadas e começava a pescaria. Era preciso fazer
silêncio, senão os peixes não viriam.
Na volta eu carregava o
recipiente telado contendo dois peixes de tamanho médio. Vovó e a minha mãe
estavam no portão esperando a gente chegar; atrás delas a Brasília creme com
uma sandália em miniatura pendurada no retrovisor. Meu avô arrumava em um
quartinho lotado de tranqueiras as vassouras fabricadas e organizava um pouco
da bagunça.
Todos estavam de volta.
Os peixes seriam limpos e preparados para o jantar. Na sala a televisão ligada
anunciava a próxima atração; os banhos seriam tomados, pratos seriam cheios e
depois esvaziados por bocas famintas; corpos cansados ganhariam descanso em
camas macias, e assim se encerrava mais um dia.
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