Lembra-se da gente no supermercado? Entre
latas de molhos e de ervilhas, entre tomates e abobrinhas, e entre biscoitos e
bolachas, pois eu não sei e pouco me interesso em saber qual é o correto a se
dizer. E os discos de vinil? De artistas variados e de capas gritantes, de
caveiras a rostos coloridos, tudo junto e misturado num só ritmo, num tom
alucinante.
E o carrinho de compras
era o nosso possante, de direção firme e rodas pequenas. Montávamos nele e
dávamos impulso com os pés e transformávamos os corredores em pista de corrida,
a mãe ficava doida com a gente. E as pessoas nos olhavam. Poucos riam, muitos
achavam um absurdo uma mãe deixar duas crianças fazendo o que quisessem, mas
não era bem assim, a gente desobedecia mesmo; no entanto, depois de tanta peraltice
e malcriação éramos brindados com um churro com recheio de doce de leite. E as
compras eram colocadas na porta- malas, comida separada dos produtos de
limpeza. E então nós íamos embora, eu no banco de trás por ser o mais novo,
você na frente, de cinto de segurança e de braço apoiado na beirada da porta,
por ser o mais velho.
Ao chegar a casa tudo
era guardado. Produtos de limpeza ficavam na garagem, enfiados dentro de um
armário branco carcomido de ferrugens, numa garagem lotada de tranqueiras, restos
de uma cama, móveis velhos e um colchão de molas que aos poucos se
despedaçava. As sacolas eram carregadas
para cima; recheadas com arroz, feijão, biscoito ou bolacha; não importava, e
muito, mas muito macarrão instantâneo. A gente era movida a miojo, bons tempos.
Os tempos de criança
foram bem proveitosos até a mãe começar a reclamar de dores de cabeça e por
consequência disso ficar doente. Dizem que a vida é justa. Em certos momentos
eu me pego a reclamar dela, da maldita da vida; que leva e traz gente na mesma
velocidade que varre das nossas mentes constantes decepções. Em outros
momentos, sinto que ela foi injusta. Não por ter deixado mamãe doente, muito
pelo contrário, pois isso serviu de aprendizado.
E a família foi se
afastando. Saudades dos finais de ano na casa da madrinha, onde todos se reuniam;
tios, tias, primos, primas, pais, mães, e a vó, de lenço na cabeça e sorriso na
cara. As crianças brincavam, enquanto os adultos, sentados em volta de uma mesa,
jogavam dominó. Dentro da casa as mulheres se revezavam na cozinha no preparo
de receitas que seriam posteriormente devoradas.
E tudo isso se desfez
depois que a vó foi embora. Foi num domingo bem cedo que ficamos sabendo da
triste notícia. Maldito ano, levou minha avó e meu melhor amigo, onze anos de
idade, uma vida inteira pela frente, ceifada pelas águas.
Anos se passaram e
muita coisa aconteceu, pouca coisa mudou. O meu único desejo é ver a família
reunida outra vez como nos velhos tempos.
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